Investigadores portugueses, em colaboração com um grupo francês, descobriram que a doença de Machado-Joseph (M-J), uma patologia neuro-degenerativa com grande incidência nos Açores e em comunidades com descendência açoreana, afecta uma zona cerebral chamada estriado, localizada na base do cérebro. A descoberta, publicada pela revista Human Molecular Genetics, é importante porque explica algo que se desconhecia até agora: a razão pela qual muitos destes doentes sofrem de distonia, um sintoma que se caracteriza por contracções musculares involuntárias dos membros. Mas o trabalho desenvolvido pelos investigadores de Coimbra, em colaboração com uma equipa francesa liderada por Nicole Déglon, é também mais um passo no caminho para testar novas terapias para a doença, o que aliás, já está em curso. "Estamos neste momento a trabalhar já numa terapia experimental neste modelo animal", adiantou o coordenador da equipa, Luís Pereira de Almeida, do Centro de Neurociências e Biologia Celular e da Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra. Essa nova fase está igualmente a ser desenvolvida com a mesma equipa francesa do instituto de investigação biomédica de Fontenay-aux-Roses.
"O nosso objectivo era produzir um modelo desta doença em animais, a fim de testarmos novas abordagens terapêuticas para ela", explicou o investigador de Coimbra, sublinhando que isso, não só foi conseguido, como levou também à verificação de que a tal zona do cérebro era afectada durante a doença. A doença de M-J é uma patologia de origem genética, em que um gene que codifica uma proteína chamada ataxina-3 está alterado. Devido a essa mutação, a ataxina-3 que é produzida também está alterada, tendo um efeito tóxico cujo mecanismo ainda é desconhecido. Já havia, antes deste, modelos da doença em animais. Mas o grupo de Coimbra decidiu tentar uma nova abordagem, que tem a vantagem de ser mais rápida, uma vez que não é necessário esperar que os animais doentes cresçam e se desenvolvam, como acontece no caso de serem transgénicos, com este gene alterado. A técnica utilizada pelo grupo de Coimbra, que incluiu a participação do jovem investigador Sandro Alves, utilizou vírus como vectores, ou veículos, para a introdução do gene mutado no cérebro dos ratos. A equipa esperava que em resultado disso os animais desenvolvessem a patologia neurodegenerativa. Não se enganaram. No prazo de um a dois meses, a equipa tinha conseguido produzir ratos com a doença de M-J. E foi ao analisar os seus cérebros que os cientistas verificaram isso mesmo. Tal como esperado, os ratos apresentavam os sinais da doença na substância negra, região que, como já se sabia, é afectada pela doença - é por isso que alguns doentes exibem sintomas de parkinsonismo. Têm ainda um problema chamado ataxia, que se caracteriza pela falta de coordenação muscular dos movimentos e que está associada à patologia no cerebelo. Mas, analisando a zona do estriado - outros grupos haviam levantado a hipótese de que essa região também pudesse estar afectada na doença - confirmaram pela primeira vez os sinais da patologia nessa zona também, explicando assim os sintomas da distonia.
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