por Marina Costa Lobo
in Jornal de Negocios
No ano passado, a entrada da Guiné Equatorial na Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) esteve iminente.
Acabou por não acontecer, e na altura, os membros actuais invocaram num comunicado duas razões de peso para a exclusão desta petro-ditadura. Por um lado, porque aquele país não é de facto um país de língua portuguesa - lá fala-se espanhol. Apesar do ditador Obiang ter emitido um decreto instituindo o português como terceira língua oficial, isso não foi suficiente para convencer os membros da CPLP.
Além disso, o facto do regime ser um dos maiores abusadores dos direitos humanos em África, continente onde a norma, já de si, não é exemplar. Mesmo assim, a CPLP encorajou a Guiné Equatorial a efectuar mudanças com vista à adesão, o que poderia ser positivo para os cidadãos daquele país. Assim, o dossiê não ficou encerrado, tendo sido prometido à Guiné Equatorial a reavaliação do seu estatuto no futuro.
Nesse contexto, em Maio deste ano uma delegação da CPLP deslocou-se à capital daquele país para verificar os avanços conseguidos desde o Verão passado. No seguimento da visita, o embaixador Luís Fonseca, chefe da delegação, declarou-se muito satisfeito, indicando que tudo se está a preparar para a entrada deste regime já em 2012 na CPLP. Seria excelente que a CPLP tivesse um papel positivo sobre a Guiné Equatorial. Infelizmente, as reformas anunciadas até agora são "para lusófono ver".
Será que passado um ano os cidadãos da Guiné Equatorial falam português? E os abusos aos direitos humanos cessaram? Não e não. No que diz respeito à língua portuguesa, o secretário-executivo da CPLP, Simões Pereira, declarou à Lusa na cimeira da CPLP do passado fim de semana o seguinte: "há a predisposição da Guiné Equatorial de introduzir o Português nos leitorados das universidades, e a criação de um centro de Língua Portuguesa na cidade de Malabo". Não sendo linguista, não me parece que a introdução de leitorados seja critério suficiente para considerar um país de língua portuguesa.
Quanto às questões das liberdades políticas, o embaixador Luís Fonseca realçou optimisticamente as reformas políticas: prepara-se um revisão constitucional com "uma limitação do número de mandatos do presidente, a criação de um Senado, uma nova câmara legislativa, e a criação do Tribunal de Contas". Tal como no ano passado se tentou instituir o uso do português como língua viva por decreto, agora pensa-se promulgar a democracia através de uma nova Lei fundamental. Isto mantendo os abusos aos direitos humanos e toda a repressão política. É preciso ver que a Constituição da Guiné Equatorial já salvaguarda os direitos humanos, e essa lei é sistematicamente violada.
De facto, o optimismo da CPLP em relação à Guiné Equatorial contrasta vivamente com a preocupação das organizações internacionais em relação às liberdades cívicas e políticas naquele país. A Freedom House incluiu o país este ano, tal como no ano passado, na lista dos "Worst of the Worst - As sociedades mais repressoras", juntamente com a Birmânia, Eritreia, Líbia, Coreia do Nore, Somalia, Sudão, Turkmenistão e Uzbekistão. Não há liberdade de associação, as manifestações são proibidas, há sucessivas detenções arbitrárias e ilegais, e não há liberdade de imprensa. Tal como disse, e bem o Secretário-Executivo da CPLP, à Lusa na cimeira do passado fim de semana "Não se pode falar em Estados livres e democráticos se os direitos humanos não forem respeitados. Por isso, sem ser uma exigência ou sequer uma condição, tem-se partilhado com a Guiné Equatorial que não existindo pena de morte e existindo o respeito pelos direitos humanos em todos os Estados da CPLP, a CPLP estaria bastante mais à vontade em proclamar a adesão da Guiné Equatorial se esse pressuposto fosse também respeitado", disse. Seria um bom começo, embora provavelmente não chegaria. Tanto no contexto dos Estatutos da CPLP, e até no contexto da recente Primavera Árabe é incompreensível o acarinhamento deste regime.
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