O ex-primeiro-ministro Mari Alkatiri chefia uma delegação designada pelo presidente José Ramos-Horta para uma missão de bons ofícios.
O antigo primeiro-ministro timorense, cuja governação decorreu de Maio de 2002 a Junho de 2006, declarou ontem, em Lisboa, que Díli pretende colocar ao serviço da Guiné a sua experiência no campo da delimitação de fronteiras e do melhor aproveitamento possível dos recursos petrolíferos, comuns aos dois países.
"Não é estranho eu seguir quarta-feira para Bissau como enviado especial de Timor-Leste. É normal noutros países, designadamente os de tradição anglo-saxónica, recorrer-se ao chefe da oposição para determinadas missões. Oponho-me ao Governo e não ao Estado", explicou o secretário-geral da Fretilin, antes de ser recebido pelo ministro português dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, como delegado de Ramos-Horta para a questão guineense.
"Primeiro tinha aceite encarregar-me do dossier do mar de Timor, mas como no Governo levantaram problemas a escolha ficou sem efeito. Mas desta vez tenho uma base de apoio forte, como é necessário para que se tenha legitimidade. Houve unanimidade na minha escolha para enviado especial à Guiné", acrescentou Alkatiri. Durante as próximas semanas tenciona pôr ao serviço dos guineenses a sua experiência de coabitação com a comunidade internacional.
"É preciso saber como lidar com todos, consolidar e estabilizar um país. É preciso ter a coragem de aceitar os desafios; e nós ainda não sofremos com a crise internacional, dada a nossa vivência no processo negocial", disse Alkatiri. Em seu entender, as experiências timorenses na definição de fronteiras e no aproveitamento dos recursos petrolíferos poderão ser úteis à Guiné, que tem lençóis de hidrocarbonetos tanto no mar como em terra. Há um grande potencial para a indústria petrolífera na Guiné. Para além das velhas jazidas do Norte, na área das fronteiras tanto marítimas como terrestres com o Senegal, apareceram nesta última década potencialidades mais a sul, que estão a ser estudadas pela empresa britânica Premier Oil.
O offshore guineense está profundamente subaproveitado. Até há poucos anos, poucas pessoas tinham ouvido falar dos blocos que a empresa nacional de combustíveis, a Petroguin, abriu à licitação de interesses internacionais, como os da Premier: áreas marítimas com milhares de km2 e em que as terras mais próximas são o arquipélago das Bijagós e a ilha de Bolama. O petróleo poderá vir a ser uma nova fonte de rendimentos para o país, que até agora vive sobretudo da agricultura e da pesca. "Conheço bem os PALOP e a Guiné-Bissau é um caso único. Ao partir da base de dois Estados com um mesmo partido a geri-los, o PAIGC, ia ser difícil. Cabo Verde ainda teve a sorte de poder contar com os seus quadros, com os seus recursos humanos; mas na Guiné foram crises atrás de crises, até se atingir o pico com o assassínio do chefe do Estado-Maior e do Presidente Nino Vieira", expôs. "Não acredito que vá continuar a viver neste círculo vicioso. São precisas reformas; é necessária uma ajuda internacional do tipo Plano Marshall", prosseguiu Alkatiri, que numa primeira fase vai estar dez dias em Bissau, acompanhado pelo antigo ministro Roque Rodrigues e por mais três elementos.
"O sonho de Amílcar Cabral foi genial, mas creio que, se continuasse vivo, não seria nunca chefe de nenhum dos Estados por cuja independência lutou. Ficaria só como chefe do partido. É sempre muito difícil a passagem de um período revolucionário para o da gestão do Estado", concluiu.
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