Marina Costa Lobo
Politóloga
in Jornal de Negócios
Nos últimos dias, fomos surpreendidos por Francisco Louçã. Ao colocar uma moção de censura ao Governo a destempo, o BE vem revelar a sua intrínseca irresponsabilidade política aos portugueses, e o que é mais recente, algum desnorte.
Por dar este passo logo depois da campanha das presidenciais, este partido está a desdizer todas as promessas de cooperação ensaiadas com o PS até há dias no apoio à campanha do Manuel Alegre. Se a moção fosse bem sucedida, levaria provavelmente ao regresso da direita ao poder, coisa que o BE afirma rejeitar. Mas como já foi dito por muitos comentadores, esta iniciativa acaba por contribuir para a sobrevivência do Governo. Apesar das vociferações de Passos Coelho, o compromisso assumido aquando das duras negociações orçamentais impede que, para já, o PSD esteja disponível para derrubar o Governo. Será preciso que algo de fundamental mude para que este posicionamento se altere, e isso dá algum alívio ao primeiro-ministro.
A questão é saber se esta moção constituiu o "momento PRD" do BE? Em 1987, o PRD decidiu colocar uma moção de censura ao executivo minoritário de Cavaco Silva. Esta moção, embora tenha sido "bem sucedida" na medida em que levou ao derrube do Governo, também foi o início do fim do partido-sensação que havia sido criado dois anos antes, em 1985. Porque nas eleições que se lhe seguiram, e como a moção de censura tinha sido contra-corrente à vontade do eleitorado, o PRD foi dizimado nas urnas, o PSD conseguiu a sua primeira maioria absoluta, e o PS recuperou o seu indiscutível lugar de primeiro partido da esquerda do espectro partidário.
O que ocorre neste Inverno de 2011, não é, à primeira vista, uma repetição desse momento, nem terá as mesmas consequências imediatas. Em primeiro lugar, porque a moção não passa, nem haverá eleições. Portanto as consequências desta acção irresponsável do BE tenderão a diluir-se junto das opiniões políticas do eleitorado.
Depois, porque mesmo que a moção fosse aprovada e houvesse eleições, toda a conjuntura é diferente, seja em termos da cor política do governo, seja em termos económicos. As probabilidades da opinião pública ser hoje totalmente contra uma moção de censura ao Executivo, como foram, em 1987, ao Governo de Cavaco, são hoje menores. Isto a julgar pelas sondagens, que dão o PS em queda continuada, e algum reforço do PSD.
Mas nem tudo é diferente daqueles tempos: pressente-se uma sede de protagonismo e um tacticismo no BE que se assemelha à ganância que o PRD tinha naquela altura, à época muito mal vista pelo eleitorado. Além disso, estes dois partidos têm outros pontos em comum: nem conseguiram verdadeira implantação territorial e local comparável com os restantes, nem constituem uma verdadeira alternativa programática face aos outros partidos. Essencialmente, ambos sobrevivem à custa do protagonismo mediático dos líderes.
É neste sentido que poderíamos chamar ao último período vivido pelo BE sob a liderança de Louçã, como um "momento PRD". Ultimamente, Louça tem-se pautado por um comportamento errático. Arriscou bastante nas Presidenciais e perdeu em toda a linha. E perdeu inclusivamente face, na forma como foi sempre sistematicamente combatendo o PS mesmo enquanto faziam campanha juntos por Alegre. Agora saído da derrota acorre a retomar o seu lugar em S. Bento, para derrubar Sócrates.
Sem lealdades antigas como certos partidos, sem história, e sem ligações associativas, o BE vive da credibilidade dos seus representantes, e sobretudo do seu líder. Só um líder sério, coerente e determinado pode ultrapassar os obstáculos institucionais que se colocam a um partido ainda relativamente novo e pequeno como o BE. E é também provável que os erros da liderança sejam castigados mais fortemente pelo eleitorado. Se uma parte substancial do eleitorado dos partidos portugueses em geral não é fiel, por maioria de razão o do BE ainda o será menos.
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